ATA DA DÉCIMA QUARTA SESSÃO SOLENE DA SEGUNDA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA PRIMEIRA LEGISLATURA, EM 02.08.1994

 


Aos dois dias do mês de agosto do ano de mil novecentos e noventa e quatro reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às quatorze horas e vinte minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão Solene destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao artista plástico Vasco Prado, conforme Requerimento nº 27/94 (Processo nº 1298/94) de autoria do Vereador Gerson Almeida. Compuseram a MESA: Vereador Luiz Braz, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Vereador Gerson Almeida, Secretário Municipal do Meio Ambiente, representando neste ato o Senhor Prefeito Municipal; Senhor Vasco Prado, Homenageado; Senhor Luis Pilla Vares, Secretário Municipal da Cultura; Irmão Elvo Clemente, representando a Secretaria da Cultura do Estado; Senhor Firmino Cardoso, representando a Associação Riograndense de Imprensa; Vereador Jocelin Azambuja, na ocasião, Secretário “ad hoc”. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, de pé, ouvirem a execução do Hino Nacional Brasileiro. Logo após, salientando ser motivo de orgulho para esta Casa estar homenagenado hoje figura tão importante no terreno das artes, concedeu a palavra aos Vereadores para se manifestarem a respeito. A Vereadora Helena Bonumá, pelas Bancadas do PT, PDT, PMDB, PPR, PFL, PP e PPS, disse ser a homenagem ora prestada ao artista plástico Vasco Prado, um reconhecimento ao seu trabalho bem como uma homenagem à arte pelo significado que sua obra tem para a história da arte brasileira. Lembrou que Vasco Prado, juntamente com outros artistas criou, na década de cinqüenta, o Clube da Gravura, que foi um marco na história da arte do nosso país. Salientou, que a obra desse artista expressa valores, sentidos, conteúdos do mundo e do nosso tempo, tendo caráter e dimensão universal. O Vereador Jocelin Azambuja, pela Bancada do PTB, falou da importância da homenagem  hoje prestada a um homem que teve uma vida inteira dedicada a nossa terra, ao povo gaúcho, às artes e à cultura do nosso Estado e cuja obra tem relação muito estreita com a nossa realidade. Finalizou, agradecendo a Vasco Prado por tudo que tem feito pelas artes na nossa Cidade. A Vereadora Maria do Rosário, pela Bancada do PC do B, disse que, ao completar oitenta anos, Vasco Prado se revela um artista cuja obra transparece um projeto magnífico e que engrandece a todos que podem conhecê-lo. Ressaltou ser esta homenagem imprescindível para atualizar o reconhecimento que a sociedade gaúcha tem para com este artista que é motivo de orgulho para todos.Ainda, leu texto de Gerd Bornheim cujas palavras, na sua opinião, expressam como ninguém, a escultura de Vasco Prado. O Vereador Antonio Hohlfeldt, refletiu sobre a obra de Vasco Prado que, nos mais diversos materiais, deixou sempre marcas e foi sempre capaz de abrir caminhos. Ressaltou a influência que a geração a que pertence o Homenageado teve na cultura brasileira, entre escritores, escultores, pintores e músicos, que é a presença do socialismo-realista na nossa arte. Ainda, elogiou o imenso mural criado por Vasco Prado, existente na Assembléia Legislativa e disse esperar que esse artista continue produzindo, pois precisamos disso. Em continuidade, o Senhor Presidente registrou as presenças, na Casa, dos Senhores Luis Fernando Veríssimo, Xico Stockinger e das Senhoras Lícia Peres, Sandra Helena Machado e Margarete Moraes. A seguir, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Vereador Gerson Almeida que, como proponente e representante do Senhor Prefeito Municipal, disse ser a obra de Vasco Prado o resultado de um esforço consciente executado com talento por um artista que, em suas próprias palavras, diz que seu trabalho é uma busca constante que vem fazendo, sempre motivada pela sua visão do homem e da vida. Logo após, o Senhor Presidente convidou a todos para, de pé, assistirem à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito pelo Vereador Gerson Almeida ao Senhor Vasco Prado. A seguir, concedeu a palavra ao Homenageado, que agradeceu a homenagem recebida e o carinho que ela representa. Após, o Senhor Presidente desejou que a força, a sabedoria e a beleza que o artista plástico Vasco Prado sempre soube ofertar para toda a humanidade e que nos orgulha continue lhe acompanhando em todos os seus dias. Às quinze horas e dezesseis minutos o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e,nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos, convidando os Senhores Vereadores para a Sessão Solene que se realizará logo mais, às vinte horas, neste Plenário. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Luiz Braz e Secretariados pelo Vereador Jocelin Azambuja, como Secretário “ad hoc”. Do que eu, Jocelin Azambuja, Secretário “ad hoc”, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelos Senhores 1º Secretário e Presidente.

 

 


(Obs.: A Ata digitada nos Anais é cópia do documento original.)

 

 


O SR. PRESIDENTE (Luiz Braz): Damos por abertos os trabalhos da presente Sessão Solene destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao Sr. Vasco Prado, de acordo com o Requerimento nº 27/94, de autoria do Ver. Gerson Almeida.

Chamamos para compor a Mesa o Exmo. Sr. Secretário da SMAM, Sr. Gerson Almeida, que está representando o Sr. Prefeito Municipal; o Exmo. Sr. homenageado, artista plástico Vasco Prado; o Exmo. Sr. Secretário da SMC, Sr. Luís Pilla Vares; o Exmo. Sr. representante da Secretaria de Cultura do Estado, Irmão Elvo Clemente; o Exmo. Sr. representante da ARI, Jorn. Firmino Cardoso.

A seguir, todos em pé vamos ouvir a execução do Hino Nacional Brasileiro.

 

(É executado o Hino Nacional.)

 

É motivo de orgulho para esta Casa poder estar homenageando hoje esta figura tão importante para todos nós, do Rio Grande do Sul, tão importante no terreno das artes, que é o artista Vasco Prado. Para nós, que estamos presidindo a Casa, é uma oportunidade ímpar estarmos ao lado desse grande artista. Podemos até contar para os nossos amigos e pessoas que conhecemos que algum dia pudemos ter a honra de estar presidindo uma Sessão sentado ao lado de alguém dessa envergadura, o que nos dá muita satisfação. É um orgulho para toda a Casa estar recebendo Vasco Prado e todos os seus amigos. Há uma grande relação de oradores que desejam fazer a sua saudação ao artista Vasco Prado. Pelas Bancadas do PT, PDT, PMDB, PPR, PFL, PP, e PPS fala a Vera. Helena Bonumá.

 

A SRA. HELENA BONUMÁ: (Saúda os componentes da Mesa.) Senhoras e Senhores que nos acompanham nesta Sessão. A homenagem que prestamos a Vasco Prado, na verdade, tem um duplo caráter: além do reconhecimento de seu trabalho ao longo de uma trajetória marcante na arte brasileira, ela significa, também, por parte desta Casa, uma homenagem à arte pelo significado que a obra do Vasco Prado tem para a própria história e trajetória da arte brasileira. E uma homenagem à arte partindo de uma Casa política como esta Câmara de Vereadores é uma coisa significativa. Entendemos que a arte é um desvendamento da realidade em níveis essenciais, que outras formas de conhecimento não conseguem dar conta, como a arte. Por isso nós sabemos que, se renunciarmos ao conhecimento que a arte nos proporciona, e que somente a arte nos proporciona, nós podemos estar perdendo. Nós podemos estar mutilando a nossa compreensão da realidade. Empobrecendo a nossa compreensão da realidade. E como a realidade é, basicamente, a realidade humana, a renúncia ao desenvolvimento do conhecimento artístico acarreta uma perda importante da dimensão do próprio autoconhecimento humano, da própria autoconsciência humana. E isso, num processo de democratização de uma sociedade, num processo de autoconhecimento de uma sociedade, é um elemento importante. Nessa dimensão, a arte é fundamental para uma sociedade que se quer democrática. A arte que consegue expressar os nossos elementos mais essenciais e a arte que se expressa com a magnitude que se expressa a obra de Vasco Prado.

Então, para nós tem esse elemento que é importante pela expressão da obra de Vasco. Esse reconhecimento por parte da Câmara de Vereadores é, também, um reconhecimento à própria arte. A trajetória de Vasco Prado é uma trajetória sobre a qual nós não precisamos falar muito, pela repercussão de sua obra e pelo grau de conhecimento que a sociedade gaúcha tem sobre o seu trabalho, e pelo seu orgulho que a sociedade gaúcha tem deste artista e de seu trabalho.

Gostaria de lembrar algumas coisas que são do conhecimento de todos: Vasco, juntamente com outros artistas, criou na década de 50 o Clube da Gravura, que foi uma coisa nova, que na realidade foi um marco na história da arte brasileira. Uma arte sensível à realidade do homem do campo, que aqui no Rio Grande do Sul, particularmente, é um setor importante das nossas raízes.

Vasco nunca se omitiu em relação às bandeiras do seu tempo, sempre demostrando grande sensibilidade às questões sociais. Obras como: “O Negrinho Liberto” e “Tiradentes” demostraram isso. A arte de Vasco Prado tem raízes. Expressa valores, sentidos, conteúdos do mundo e do nosso tempo, especialmente aqui do Rio Grande do Sul. Expressa espaço que não é só físico e geográfico, mas histórico e social. Das nossas raízes cria uma síntese superior. Expressa o regionalismo. Expressa o particular, mas não fica preso a ele. Tem caráter e dimensão universal. Vasco Prado, 80 anos. Com sua vasta liberdade de criação e a arte, com uma dimensão superadora que corresponde a sua visão de mundo. Nas suas próprias palavras: “É o meu trabalho uma busca constante que venho fazendo através de erros e acertos, mas motivado sempre pela minha visão afirmativa do homem e da vida”.

É esta visão afirmativa do homem e da vida que tem expressado com muita riqueza a vida do homem de nossa terra e de nosso tempo.

A nossa homenagem, da Bancada do Partido dos Trabalhadores, que se soma hoje à homenagem desta Casa, por seu trabalho, por sua contribuição e pela beleza que Vasco Prado nos traz. Muito obrigada.

 

(Revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Queremos agradecer a presença desta grande figura das artes literárias do Rio Grande do Sul, Luís Fernando Veríssimo, por quem temos grande admiração e que deverá também ser homenageado nos próximos dias, por esta Casa.

O Ver. Jocelin Azambuja está com a palavra para falar em nome do PTB.

 

O SR. JOCELIN AZAMBUJA: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa.) Para o Partido Trabalhista Brasileiro, é muito importante poder estar aqui e prestar também seu reconhecimento e sua homenagem a um homem que tem uma vida inteira dedicada à nossa terra, ao povo gaúcho, às artes e à cultura do nosso Estado. E que tem sabido ao longo de sua vida, desde seu nascimento, na longínqua Uruguaiana, fronteira, quem sabe das muitas influências das suas relações artísticas, com os nossos irmãos do Prata, naquela confluência das relações com o Uruguai e Argentina. É importante que possamos ter como um marco na linha cultural do nosso Estado a figura de Vasco Prado. A Vera. Helena Bonumá fez uma reflexão importante sobre sua obra, outros colegas o farão também. Sentimo-nos felizes de, num País pobre, miserável, subdesenvolvido, como é o nosso Brasil - lamentavelmente -, termos que assumir a nossa condição, não fugirmos, termos um artista como Vasco Prado que tem uma obra sempre ligada à questão social, até pela relação estreita da arte com o cotidiano, por isto que ele é considerado um artista do nosso tempo. Temos que questionar e analisar estes aspectos importantes. Num País que esquece a cultura, a educação, num País que inverte os valores desta Sociedade e que causa constante preocupação a todos nós é importante homenagearmos, reverenciarmos um artista que tem uma relação tão estreita com esta nossa realidade, com o nosso social. Foi muito feliz o Ver. Gerson Almeida ao fazer esta proposta de homenagem a Vasco Prado. Nos orgulhamos mais de estarmos aqui e deixarmos algumas palavras de reconhecimento ao seu trabalho; que a sua contribuição artística coopere para que possam-se desenvolver as artes no nosso Município e Estado. Que ajude esta reflexão de apoio que merece, permanentemente, a cultura, a educação, que correm paralelamente numa busca constante de aprimoramento e desenvolvimento humano. Precisamos de homens desta qualidade, desta condição de doação à sociedade, de trabalho positivo à sociedade; precisamos estar sempre homenageando-os nesta Casa. O nosso agradecimento e reconhecimento por tudo que tem feito pelas artes na nossa Cidade e nosso Estado. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Também um outro grande nome que foi homenageado há alguns dias no MARGS, numa Sessão Solene realizada pela Câmara Municipal naquele recinto, o artista Xico Stockinger, também está presente nesta Sessão Solene. Os agradecimentos desta Casa pela sua presença. Também a Lícia Peres, que já recebeu homenagens desta Casa, dá-nos muita satisfação com a sua presença, como todos os Senhores e Senhoras.

A Vera. Maria do Rosário está com a palavra, e fala pela Bancada do PC do B.

 

A SRA. MARIA DO ROSÁRIO: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os membros da Mesa.) Ao completar 80 anos, Vasco Prado se revela um artista cuja obra transparece em projeto magnífico e que engrandece a todos que podem conhecê-lo. Uma obra cujo caráter de universalidade se impõe dentro de uma moldura regional. Nascido em Uruguaiana, construiu um trabalho e uma trajetória internacionalmente reconhecida. Juntamente com Glênio Bianchetti, Carlos Scliar e Danúbio Gonçalves, que queremos lembrar, fundou o Clube da Gravura que se tornou um marco da arte brasileira. Sempre preocupado com as questões sociais e estéticas, Vasco de fato nunca se omitiu do nosso tempo e dos debates, das discussões e do pensar as mudanças sociais necessárias para uma sociedade mais humana. É preciso dizer, no entanto, que sua obra somente possui um caráter particular enquanto universal. Mais do que justa, essa homenagem que realizamos hoje, esta reunião de amigos, interpreta um sentimento muito forte da Cidade de Porto Alegre. Mais do que justa é uma homenagem imprescindível. Não porque precisamos nos lembrar da extensa obra do artista plástico Vasco Prado, pois ela está sempre presente em nossa memória, sempre presente para nós que vivemos nesta terra. Esta homenagem é imprescindível para que atualizemos sempre o reconhecimento que a sociedade gaúcha e que a Cidade de Porto Alegre deve ter com o artista, que é para nós motivo de orgulho, de reconhecimento enorme.

As esculturas de Vasco Prado mostram um artista com pleno domínio do seu meio de expressão, instituindo figuras que se equilibram no espaço, criando ao mesmo tempo tensões de massas que detém um pensamento e uma visualidade imbuída da beleza da planura sul-riograndense. Vasco é um marco de referência obrigatória para a história da arte gaúcha e a sua atualidade para o nosso tempo.

Nada expressa melhor a escultura de Vasco Prado do que as palavras de Gerd Bornheim citadas em um texto sobre sua obra que diz o seguinte:

“Realmente, a escultura é de um modo muito específico, uma arte destinada a todos: seu lugar exato é o ponto de afluência das multidões, na contraditória convergência de idéias e sentimentos que compõem a cidade, como que a presidir a nervosa vida social do Homem. E no entanto, em sua gênese, nada mais silencioso que a escultura: o silêncio absoluto da pedra bruta, resistente e inamovível. Mas há um silêncio ainda mais forte, vindo de muitas distâncias, confluência de um homem; há a suficiência das mãos que tudo sabem, síntese da terra e do humano. E são elas que, com o estalido seco do buril, lascam a pedra e transformam a música em forma. O silêncio porém, permanece; a pedra é condensação mesma do primevo. Mas ela adquire brilho, assume o traço exato, torna-se sensual como que a pedir o afago que a compreenda, ou a exaltar aquele momento, humilde ou grandioso, em que o homem se sabe e se reconhece. É como se as coisas e a vida voltassem a sua raiz primeira, ou mais tarde, ao cabo de um itinerário, encontrassem enfim seu repouso”.

É nessas palavras de Gerd Bornheim que encontrei uma definição do Vasco. E nesse dia de homenagem que o Ver. Gerson Almeida propôs a esta Câmara e que nós todos como Vereadores desta Cidade abraçamos carinhosamente, é neste dia que nos parece que Porto Alegre sente assim a obra e a pessoa de Vasco Prado. E se reconhece na sua obra e na sua pessoa, porque se confunde com ele. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Registramos, também, as presenças das senhoras Sandra Helena Machado, representante do CPERS Sindicato, e de Margarete Moraes, Secretária Substituta da Secretaria Municipal de Cultura.

O Ver. Antonio Hohlfeldt está com a palavra, e fala pela Bancada do PSDB.

 

O SR. ANTONIO HOHLFELDT: Exmo. Sr. Presidente, Ver. Luiz Braz; prezados amigos componentes da Mesa, Irmão Elvo Clemente, Companheiro Ver. Gerson Almeida, nosso embaixador da Associação Sul-rio-grandense de Imprensa, como chamamos com muito carinho; companheiro Pilla Vares, da Secretaria Municipal da Cultura; muito especialmente nosso homenageado prezadíssimo Vasco Prado; meus amigos, senhoras e senhores. Como ficcionista eu aprendi que o significado dos nomes das pessoas e personagens sempre pode ser uma espécie de chave para se pensar a respeito das figuras humanas. Por isso, quando estava pensando em o que dizer ao Vasco nesta comemoração, me ocorreu, de início, desde logo e forte, a imagem daquele outro Vasco, que é o personagem do Érico Veríssimo, que é assim, à sua maneira, um guerreiro, uma figura combativa, uma figura de extrema contestação, e que marca vários dos romances do Érico. E, na verdade marcam uma fase, um período, de certa maneira, da nossa vida, como todos os nomes diferentes que levou aos diferentes romances criados. Mas aí eu me dei conta de que o Vasco se chama Prado, e que esse nome faz um contraste evidente com o primeiro, e de uma certa maneira isso é a oposição, é a síntese, e por isso mesmo, claramente, a reflexão do que foi sempre a obra de Vasco Prado: de um lado o combate, e de outro a tranqüilidade; de um lado a luta, e de outro a capacidade de olhar as coisas com ternura, mas sobretudo com compreensão.

Nos materiais mais diversos, na pedra, na terracota, no ferro, na madeira, nas técnicas que todos nós fomos descobrindo década a década, no desenho, na litografia, na calcografia, no carvão, no lápis, na xilo, o Vasco deixou sempre marcas e foi sempre capaz de abrir caminhos. A Vera. Maria do Rosário há pouco lembrava o Clube da Gravura com Scliar, o Glauco, o Danúbio e o Glênio, cada um num canto diferente deste País. E o Gerd Bernheim, neste catálago tão bonito que a Secretaria Municipal e Cultura produziu, anota uma coisa que eu queria resgatar aqui que me parece que é extremamente importante: a influência que essa geração a que pertence o Vasco teve na cultura brasileira, entre escritores, entre escultores, pintores, entre músicos, que é a presença do socialismo-realista na nossa arte. A presença da figura, a coragem de dizer coisas sem máscara, claramente identificadas, que não por um acaso reuniu poetas, escritores de prosa, escultores, pintores, músicos, numa luta que aqui passou pelo Portinari, que aqui passou por todo movimento do Romance de 30. E que, felizmente alguns, para nossa alegria ainda remanescem e podem continuar dizendo que nós deveríamos continuar essa luta. Nós vamos receber nos próximos dias, de retorno a Porto Alegre, um desses escritores que se encontra longe e que como Vasco estará comemorando aqui em Porto Alegre 40 anos de vida, que se chama Ivan Pedro de Martins; que também no ano de 1945 enfrentou a ditadura do Estado Novo para poder expressar no seu romance, Fronteira Agreste, esta mesma realidade polêmica que o discurso cetegista adora esconder as contradições deste Estado: a violência, os expurgos, as marginalizações e as concentrações de terra às custas do peão, antigo gaúcho, hoje colono sem-terra. Isso tudo Vasco, tu querendo ou não, se te dás contas ou não, e eu tenho certeza que tu te dás conta, está nessa tua obra que soma centenas de exemplares e que talvez por isso mesmo volta e meia provoca polêmicas. Como é o caso do Negrinho do Pastoreio, lá do Alegrete, que fugia do padrão tradicional e que por isso mesmo não era aceito por quem pretendia apenas fazer um discurso de tapa-buraco, de fingir que tudo ia muito bem obrigado, mas que não queria aceitar exatamente que a figura mais gaúcha deste Estado, sem dúvida nenhuma, era a condição daquele negrinho permanentemente violentado e agredido. Por outro lado, acho que andou bem a Assembléia Legislativa quando chamou o Vasco Prado para criar aquele imenso mural metálico que lá está. O Vasco pode contar a história melhor que nós, mas, certamente, terá sido do Vasco a idéia de juntar o Poder Legislativo com a imagem do Tiradentes e a imagem do Tiradentes do Poder Legislativo com o romanceiro da inconfidência da nossa Cecília Meireles. Nenhum casamento melhor do que esse para traduzir exatamente, com absoluta consciência da função de obra de arte, de como a obra de arte pode ser uma coisa útil e pública sem deixar, em nenhum momento, de ser arte permanentemente. É isso, Vasco, que hoje nós queremos homenagear nesta Sessão. Coincidência ou não, em 1974, a pedido do Ministério da Educação e Cultura, eu organizava um catálogo sobre uma exposição de artes plásticas no Rio Grande do Sul, que viajaria o Brasil todo e chamava a atenção como é forte a presença da escultura no Rio Grande do Sul, como é forte, de um modo geral, o desenho do Rio Grande do Sul que, em alguns casos, se transforma na escultura. Concluía eu, dizendo, uma conclusão sempre provisória, evidentemente, mas confesso que em vinte anos não mudei de idéia, que a solidão, o isolamento, as dificuldades por que a história desse Estado e esse povo passaram, que do clima frio que hoje estamos vivendo novamente depois do calor de ontem, a todos estes desafios de uma decisão de sermos brasileiros e não sermos qualquer outra coisa, apesar das tentativas separatistas que volte e meia retornam, de nós termos aprendido a amar o nosso chão e termos palmilhado essas dificuldades, que são os chãos de pedras que temos nesse estado, porque nem sempre ele é verde, infelizmente - aliás, da pedra nascem coisas boas como a videira. Eu fiquei imaginando a infância do Vasco nos horizontes sem fim de Uruguaiana, quem sabe lá a sonoridade e os ecos daqueles índios escultores dos sete povos e agora, sentado na cadeira, enquanto discursavam os companheiros Helena Bonumá, Maria do Rosário, Jocelin Azambuja. Essa expressão quase sem fim do Vasco, quem sabe lá, repassando num filminho rápido esses oitenta anos da vida, da obra, das pessoas com quem ele cruzou. Eu fiquei lembrando o Vasco, o atelier que eu tive a felicidade de conhecer nas Três Figueiras - eu iniciava no jornalismo -, depois o da Coronel Marcos, eu fiquei imaginando o quanto os gregos foram fantásticos de imaginar aquela teoria que Aristóteles expressou da transformação da potência no ato pela mão do artista, de uma pedra bruta numa escultura final e essa solidão enorme de um atelier grande, como é o atelier de sempre, o Vasco, ele trabalhando, batendo e cinzelando e burilando e, de repente, estava ali a peça aparecendo, uma peça que, até então, só havia existido na cabeça e talvez nos olhos do Vasco, ao longo de décadas, quem sabe lá, desde a infância lá da distante Uruguaiana. É por tudo isso, Vasco, que esta Cidade te deve, e está a te dever esta Câmara, na proposição do companheiro Gerson Almeida - que hoje responde por uma área difícil, que é salvar e manter esta Cidade, que é o meio-ambiente - que homenageia na proposta que foi aprovada por unanimidade pelos Vereadores desta Casa. Acho que te devemos muito, porque tu embelezaste um pouco a Cidade. Tu embelezaste as casas das pessoas que têm as tuas obras, e eu quero dizer que continua na minha parede imensa aquela calcografia do pôr-do-sol sob o Guaíba que tu fizeste lá em 72, 73. Embelezaste sobretudo essas esculturas, esses trabalhos que se distribuíram pelas praças, pelas ruas, enfim, por tantos cantos da Cidade; e não só teus, diga-se de passagem, mas também do Xico, que comemoramos há poucos dias, do Tenius e de tantos outros. Eu espero, Vasco, que tu consigas continuar produzindo sem parar como até aqui. Nós precisamos de mais obras tuas. E, sobretudo, espero que esta Casa tenha a sensibilidade sempre de, às vezes, parar um pouquinho a sua lide política do dia-a-dia para fazer este tipo de homenagem, porque ela também é, ao menos no que nos toca, uma homenagem eminentemente política, além de carinhosa, emocional, pessoal ao artista Vasco Prado, que tem traduzido o Rio Grande, talvez não como muitos querem, mas da maneira como a maioria realmente precisa que seja traduzido. Um abraço Vasco. Muito obrigado. (Palmas.)

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Agora que as Bancadas da Casa já se manifestaram, nós vamos conceder também um tempo da tribuna para o representante do Prefeito Municipal, Vereador desta Casa e autor da proposição, Ver. Gerson Almeida.

 

O SR. GERSON ALMEIDA: Senhores componentes da Mesa; companheiros e amigos; demais Senhoras e Senhores presentes aqui. Primeiro quero agradecer a generosidade da Mesa da Casa que está quebrando, vamos dizer assim, o protocolo e permitindo que, nesta solenidade, fale um não-Vereador, na medida em que estou exercendo a condição de Secretário Municipal do Meio Ambiente, e também a generosidade do companheiro Luiz Pilla Vares, companheiro de secretariado, que também é o melhor representante do Prefeito para uma solenidade como esta, e que me permitiu que representasse o Prefeito, então, para poder colocar algumas palavras. Eu não quero tratar o artista Vasco Prado como amigo, porque não me quero-arrogar uma intimidade que não possuo. No entanto, o Vasco é uma daquelas pessoas que, mesmo antes de se conhecer pessoalmente, nós já cultivamos um profundo carinho e simpatia. Por isso, quando tomei esta iniciativa, aprovada por unanimidade pelos Vereadores de todas as Bancadas aqui da Câmara Municipal, era exatamente porque a arte de Vasco Prado, ao longo de décadas de trabalho, cada vez mais tem-se afirmado como uma criação estética superior, profundamente enraizada nos temas de nossa tradição local. Ela, entretanto, transcende o regionalismo e a sua tendência à autoproclamação de narcisismo para extrair dele aquilo que lhe confere, precisamente, uma dimensão universal. Isto é o resultado de um esforço consciente executado com talento por um artista que, em suas próprias palavras, diz que o seu trabalho é uma busca constante que vem fazendo, sempre motivada pela sua visão afirmativa do homem e da vida. E essa capacidade de tratar do particular, sem ficar, no entanto, prisioneiro da lenda e do seu contexto ideológico, com que, por exemplo, o seu Negrinho do Pastoreio, já citado nesta tribuna, deixasse de ser o negro humilhado em agonia, que se deixava comer pelas formigas, inspirando não mais do que piedade, para se transformar, conforme palavras de Marc Berkowitz, num verdadeiro hino à liberdade, à dignidade, ao desejo de colocar o sol ao alcance de todos. Uma obra que ilustra não somente a maneira de trabalhar de Vasco Prado, mas também o seu modo de pensar e o seu posicionamento de vida, confirmando, portanto, suas próprias palavras.

Este gaúcho nascido a 16 de abril de 1914 na cidade de Uruguaiana, tem recebido, além do reconhecimento internacional, como atestam suas inúmeras exposições e prêmios, o carinho da gente da sua terra demonstrado por suas várias obras espalhadas por praças e edifícios públicos na Capital e no interior do nosso Estado. Conceder a este artista o Título de Cidadão Emérito de Porto Alegre é reconhecer toda uma vida de trabalho aqui desenvolvida e que leva o nome de nossa terra escrito em cada obra sua, ultrapassando nossas fronteiras e recebendo o reconhecimento universal. Não é por outro motivo que coube ao Vasco Prado a responsabilidade de inscrever o seu olhar sobre a nossa história nos murais da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, o que fez com maestria épica, que só tem paralelo, a meu juízo, na literatura de Érico Veríssimo. Os painéis intitulados “Farroupilha” são o tempo e o vento da escultura gaúcha. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Senhoras e Senhores, solicito que todos fiquem de pé, para que possamos entregar o Título de Cidadão Emérito ao artista Vasco Prado. Solicito ao Ver. Gerson Almeida, autor da homenagem, para que proceda à entrega do Título.

 

(Procede-se a entrega do título.) (Palmas.)

 

Nós, que tanto admiramos as obras de Vasco Prado, agora teremos a oportunidade de também admirar as suas palavras. Oferecemos a tribuna desta Casa para que o grande artista Vasco Prado possa nos brindar com suas palavras.

 

O SR. VASCO PRADO: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. A esta altura do campeonato, não tenho outra coisa a dizer a vocês a não ser o respeito e o carinho que esta homenagem significa para mim. Aos senhores, aos Vereadores, aos meus amigos, muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Vamos chamar de “três colunas filosóficas” que são muito importantes na vida da humanidade: a coluna da força, a coluna da sabedoria e a coluna da beleza representadas na obra de Vasco Prado na presença permanente do homem, da mulher e do cavalo. Que a força, a sabedoria e a beleza que o senhor sempre soube ofertar para toda a humanidade, e que nos orgulha no contexto de toda a sua obra, o continue acompanhando em todos os seus dias. Muita força, muita beleza e muita sabedoria, sempre. Muito obrigado. (Palmas.)

Estão encerrados os trabalhos.

 

(Encerra-se a Sessão às 15h16min.)

 

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